Por Antonio Ricardo Soriano - Revisão: Roseli Venancio Pedroso
Elie Politi é um amigo que conheci através dos
sites Salas de Cinema de São Paulo. Um grande cinéfilo! Dono de um acervo
gigantesco de filmes.
Ele sempre quis me conhecer pessoalmente e me
presentear com algo muito íntimo e especial: uma pasta contendo recortes de
jornais de cada filme que assistiu em São Paulo, a partir de 1960.
Nos encontramos em seu apartamento em 06/08/2022 e
recebi a pasta recheada de recortes. Eram comuns os anúncios de filmes
em cartaz nos cinemas da cidade, nas últimas páginas dos jornais.
Fiquei muito feliz com o presente, pois eu também recortava os anúncios de jornais dos filmes que assisti a partir de 1980, quando frequentava os cinemas do centro de São Paulo. Com a diferença que eu acabei, infelizmente, me desfazendo dos meus recortes. Acabei encontrando alguns, por causa do meu tio Gilberto (in memoriam) que costumava colocá-los dentro das capas de suas trilhas sonoras de filmes. Muitos deles digitalizei e publiquei.
Dois anúncios que escolhi de centenas que recebi de Elie. |
Eram poucas as lembranças que podíamos guardar de cada filme que assistíamos. Em São Paulo, nos anos de 1980, tínhamos apenas uma revista especializada em cinema, a Cinemin, vinda do Rio de Janeiro.
O mais interessante, no encontro que tive com o Elie, foi saber que ele viveu parte de sua infância dentro de uma sala de cinema. Seus tios eram proprietários de duas salas de cinema, no Egito! Os cines Ferial Cinema (que, atualmente, encontra-se fechado) e o Radio Cinema (ainda em funcionamento), ambos em Alexandria.
Abaixo, um pouco sobre a vida de Elie, por ele mesmo:
Nasci em Alexandria, Egito, uma cidade muito cosmopolita até a década de 60 e que acompanhava a vida cultural da Europa. Saímos do Egito em 1959 e viemos para o Brasil. Minha educação básica foi feita em Alexandria no liceu Frances.
Éramos, desde os quatro anos de idade, levados pela escola a ver filmes no cinema. Meus coleguinhas de escola - estou me referindo às sete primeiras séries do primário - também adoravam cinema, e íamos em grupos ver faroestes e filmes de aventura.
Meus pais me levavam a concertos, shows e cinemas. Eles sempre gostaram de atividades culturais, sem dispensar a praia e as viagens em feriados ou férias. Destaco que minhas lembranças são memórias da infância, até os 13 anos.
Meus tios eram donos de dois cinemas onde eu tinha entrada livre. Assistia pelo menos a um filme por semana. Não existia censura prévia e os pais levavam até crianças de colo.
Havia uns doze cinemas na
cidade, cada um lançando filmes em exclusividade de cada companhia distribuidora.
Havia o cinema da Metro, o da Fox, o da Columbia, e assim por diante. Os cinemas dos meus tios traziam, principalmente, filmes da United Artists, europeus e
independentes.
Meus tios, às vezes para comemorar meu aniversário, fechava uma sessão especial e eu convidava a classe inteira do colégio. Assim, fazíamos a festa lá e assistíamos um filme. Assim foi com meu aniversário de dez anos, com 'A Volta ao mundo em 80 dias' (1956).
A única maneira de ver filmes era no cinema, nas telas gigantescas da época, em lançamentos ou reprises, o que era frequente no mundo inteiro.
Ao chegar ao Brasil, com 13 anos, o primeiro filme que vi foi 'Os Dez Mandamentos' (1956), que havia sido proibido no Egito pelo novo governo do qual fugimos, por motivos religiosos. Lembro das filas no cine Ipiranga.
Dali para a frente, sempre assisti pelo menos dois filmes por semana, até me formar primeiro em Engenharia e, depois, em Cinema, pela Escola de Comunicações e Artes da USP (1971-1975). Publiquei livros de química e vários artigos sobre meio ambiente.
Minha primeira câmera foi uma Kodak Brownie 8mm., presente de meu avô, aos doze anos de idade. Tenho imagens raras da praia em Alexandria, do navio com o qual viemos ao Brasil, da família etc.
Fiz, na época da faculdade, um curta documentário chamado 'Visão Paulista' e um curta de ficção-científica chamado 'O Fim', todos em 16mm. No final do curso, dirigi um curta documentário chamado 'Menotti', sobre o poeta Menotti Del Picchia, desta vez em 35mm.
Fiz muito, mas muito mesmo, filmagens em super-8, com imagens de viagens e reuniões com amigos e familiares.
Também fiz, por conta própria, um curta super-8, documentando a vida do estudante de Geologia da USP, Alexandre Vannucchi Leme, com depoimentos e filmagens do translado do corpo, após dez anos de seu assassinato.
Também montei, nos anos de 1980, um curso de História do Cinema, quando se iniciou o período do VHS. Este curso foi dado várias vezes em colégios, cursinhos e outras instituições.
Até hoje, coleciono DVD's, assim como colecionava filmes em VHS. São mais de 3100 títulos!
Um item que precisei fazer loucura para adquirir foi uma caixa comemorativa luxuosa do cinquentenário de 'Cidadão Kane', edição limitada e numerada, contendo dois livros, roteiro original, várias fotos, folhetos e duas fitas em VHS (que depois substituí pelos respectivos DVD's). Esta caixa é tão grande e pesada que, para caber na mala, tive que abandonar peças de roupas no aeroporto de Nova Iorque.
Outro item que tive que pagar por excesso de bagagem foi um canudo enorme com a reprodução do poster original de 'Metropolis', vindo da Alemanha.
Uma das coisas que também faço, além de colecionar filmes, é ir frequentemente ao cinema e participar todos os anos da Mostra Internacional de Cinema, desde sua primeira edição.
Para finalizar, só posso recomendar:
Assista muitos filmes, mas pense e escreva a respeito, treine elaborar relações entre o filme visto e outros, discuta como este filme te tocou, emocionou ou motivou.
Por outro lado, não esqueça de viver também fora das salas de cinema. A sua vida é mais importante. Eu já perdi sessões por preferir conversar com amigos e, na frente de um chopp ou um café.
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