Sessão pipoca
no quintal
Se tem uma coisa que a criança gosta é de novidade. E, nos anos 60, em Nova Esperança, no noroeste do Paraná, onde me criei, novidade tinha nome e sobrenome: “cinema no quintal do seu Rubens Bonetti”.
Nossa casa, aos olhos infantis, era uma verdadeira mansão, e o quintal, amplo, parecia um anfiteatro natural, perfeito para exibições cinematográficas ao ar livre. Meu pai, um apaixonado por fotografia e cinema, era um cinéfilo autêntico, daqueles que transformavam cada projeção em um evento memorável.
Acredite se quiser: ele escreveu muitas vezes para os estúdios nos Estados Unidos e recebeu fotos autografadas de atores e atrizes famosas. Eu, pequena e sonhadora, fico pensando se os astros de Hollywood sabiam que suas imagens viajariam milhares de quilômetros para parar em nossa casa, bem ali, no álbum que meu pai colecionava com tanto amor e orgulho. Temos até hoje esses álbuns.
Mas o que realmente fez a alegria da molecada era o projetor de filmes mudos.
As crianças do bairro vinham correndo ao saber que aquela noite teria filme para assistir no quintal dos Bonetti. O quintal virava um cinema a céu aberto, e nós, meus irmãos e eu, éramos os donos do espetáculo.
Era um evento verdadeiro! Algumas crianças traziam banquinhos, outras se aboletavam no chão mesmo. Quando a fita começava a rodar, ninguém piscava. O silêncio era absoluto, só quebrado por risadas e gritos empolgados.
Com o tempo, tudo mudou. Os vizinhos compraram televisões, o quintal perdeu sua graça e o projetor acabou guardado em um armário, como um troféu de uma época inesquecível.
Mas ainda hoje, sempre que vejo a luz de um projetor cortar a escuridão, sou transportada de volta às noites estreladas. Consigo ver o lençol balançando ao vento, ouvir as risadas ecoando pelo quintal e sentir a presença do meu pai, no comando improvisado, cuidando para que a mágica acontecesse.
E é por isso que, em cada filme que assisto, em cada imagem que capturo, guardo comigo um pouco daquela infância em Nova Esperança – quando o cinema não era apenas um espetáculo, mas um presente de amor e fantasia, projetado diretamente do coração de um pai para seus filhos e para um quintal cheio de crianças vizinhas.
Essa é daquelas histórias que não precisam de rolos de filme para existir – elas seguem brilhando dentro de nós, iluminadas pelo carinho de um pai que fez do quintal um grande cinema e da infância a maior delícia do mundo, comprovando que as histórias não terminam com os créditos finais – elas seguem em cartaz dentro de nós, sempre prontas para mais uma exibição na sala escura da vida.