70mm: o auge do cinema espetáculo

Por Filipe Salles (Fotógrafo e cineasta)

Foi inventado em 1929, ainda no cinema mudo, mas ficou esquecido e restrito até a década de 50. No início da década de 40, as pesquisas no campo da tecnologia de transmissão eletrônica de imagens já haviam chegado, nos EUA, a um grau de excelência que possibilitou a invenção da TV comercial. Num primeiro momento, este avanço não chegou a incomodar, mas já na década de 50, a TV representou para o cinema a inclusão de um concorrente direto e potencialmente promissor, e cuja consequência mais próxima seria sua extinção.

Levando-se em conta que o cinema era uma das maiores fontes de renda americanas, a televisão punha-se como um rígido anteparo ao avanço das produções em película, tanto pela comodidade de assistir filmes pelo aparelho de TV quanto pelo custo menor de uma produção eletrônica. Como em ambos, o interesse comercial era proeminente, a saída que os grandes estúdios encontraram foi a criação de sistemas impossíveis de serem reproduzidos em toda sua grandeza e magnitude pela TV. Em outras palavras, transformar o cinema num espetáculo insubstituível. Um deles foi a cor, outro, o som estereofônico e quadrifônico, e ainda outro, a retomada dos grandes formatos.

Surgiu daí o conceito de grande produção e da volta da bitola de 70mm. E, de fato, era realmente impossível reproduzir a experiência proporcionada pela sala escura numa projeção em 70mm, dada a qualidade da imagem e do som, que ainda hoje nenhuma outra bitola, tanto em película como em vídeo, jamais alcançou.

O 70mm representou o auge do cinema espetáculo nas décadas de 50 e 60 (a era dos grandes estúdios e das grandes estrelas) e as projeções de 70mm em telas gigantescas, sem dúvida, fizeram o cinema triunfar como indústria sobre a televisão, numa época em que a tecnologia eletrônica ainda era muito limitada.



Mas, mesmo hoje, com todo o aparato de vídeo de alta definição e avançados equipamentos, o 70mm ainda se afirma como o mais contundente espetáculo visual já criado, por uma razão muito simples: conforme se pode perceber na imagem acima, o 70mm é uma bitola com o dobro da largura do 35mm, e seu formato de 1:2,20 representa entre 3 e 4 vezes a área útil de um fotograma 35mm. Disso decorre a projeção de uma imagem extremamente nítida, de uma riqueza de detalhes impressionante e com possibilidade de ampliações muito maiores, sem perda de qualidade. A isso, acrescenta-se também o som quadrifônico, que em relação ao 35mm convencional, que, na época, era estéreo, permitia a inclusão de duas pistas de som a mais, e fazia do 70mm uma experiência extasiante.

E por que não se produzem mais filmes em 70mm? Porque são extremamente caros, com equipamentos muito maiores e cujo orçamento multiplica-se vertiginosamente em relação ao 35mm. Por este motivo, mesmo os filmes produzidos em 70mm são, na maioria, grandes épicos, cuja temática, evocando arquétipos heroicos de grandes personagens e histórias marcantes, garantiriam, na pior das hipóteses, um retorno aos milhões investidos nestes filmes. E, com efeito, os filmes mais caros da história foram estes, como Ben-Hur (William Wyler, 1959), Cleópatra (Joseph Mankiewicz, 1963 – provavelmente o mais caro filme já produzido), Os Dez Mandamentos (Cecil B. de Mille, 1956), El Cid (Anthony Mann, 1961) ou mesmo 2001 - A Space Odyssey (Stanley Kubrick, 1968).

Atualmente, o 70mm ainda encontra espaço em produções com fins científicos ou entretenimento puro, como é o caso do IMAX, que se utilizava da bitola deitada (agora a projeção IMAX é digital).

Mas a experiência de assistir a um destes filmes em 70mm levou muitos empresários a manter um arquivo de cópias em 70mm, principalmente na Europa e nos EUA, e que são exibidas periodicamente em salas específicas. Mesmo filmes produzidos originalmente em 35mm, como Star Wars ou Indiana Jones, também ganharam cópias ampliadas em 70mm, claro, sem a mesma qualidade, mas ainda assim sendo uma grande experiência.

65mm

Outro aspecto deve ser abordado em relação ao 70mm. Embora seja comum se referir a ele como 70mm, esta é na verdade a bitola de EXIBIÇÃO, e não a de CAPTAÇÃO. Isso se deve a motivos práticos. Os 5 mm (2,5 de cada lado) que se apresentam após a perfuração são dedicados às bandas sonoras magnéticas da cópia. Como não há registro do som na câmera, não é necessário este espaço depois da grifa e dos rolos de tração das câmeras. Portanto, a bitola das câmeras é 65mm, que são copiados numa bitola de 70mm para projeção. Dependendo do sistema utilizado, esta cópia pode ser ampliada, reduzida ou anamorfizada, como nos sistemas Panavision e Todd-AO.

Formatos para Bitola de 65/70mm

Janela 1:2,20 (1,912" x 0,870") – Formato Standard
Janela 1:2,35 (1,912" x 0,816") – 
Formato anamórfico antigo (até década de 70)
Janela 1:2,40 (1,912" x 0,797") – Formato anamórfico moderno

Entretanto, mesmo com tais recursos, o custo de uma produção desta magnitude era inviável para a maioria dos estúdios, de tal maneira que foi necessária a criação de sistemas alternativos. Tais sistemas, os formatos especiais, simulam diferentes formatos numa mesma bitola, ao ponto de permitir, com algumas restrições técnicas, um formato próximo à proporção do 70mm numa bitola de 35mm.
Parte do texto Bitolas e formatos no cinema, de Filipe Salles.

Novo filme de Tarantino será exibido em 70mm

O próximo filme de Quentin Tarantino já tem data marcada. Segundo a Weinstein Company, o lançamento de "Os Oito Odiados" está previsto para 25 de dezembro nos Estados Unidos e vem com novidade: o faroeste ambientado no pós Guerra Civil será exibido, durante duas semanas, em formato 70mm. A ideia é distribuir as cópias digitais somente a partir de 8 de janeiro. No Brasil, o longa terá distribuição da Diamond, ainda sem data de estreia, e deve ser lançado direto no formato digital, devido à inexistência de salas com projeção nessa bitola.

A decisão radical de explorar o 70mm, hoje uma raridade nos cinemas do mundo, foi do próprio diretor, famoso defensor da película. Esse não é o primeiro lance polêmico envolvendo o projeto. Em 2014, ainda em fase de desenvolvimento, Tarantino assistiu ao vazamento de seu roteiro original, que logo depois foi publicado no site Gawker.




Depois de promover uma leitura pública do script, o cineasta chegou a desistir do filme, mas voltou atrás e decidiu retomar o trabalho após mudanças drásticas na história. Samuel L. Jackson, Kurt Russel, Jennifer Jason Leigh, Walton Goggins, Demian Bichir, Tim Roth, Michael Madsen e Bruce Derne estão no elenco principal.
Texto publicado no Portal Filme B, em 12/06/2015.

Leia, também, o texto Cinemas de rua com 70mm, de Paulo Roberto Elias.
Conheça tudo sobre o formato 70mm no site In70mm.com.

Abaixo, antigas exibições em 70mm na cidade de São Paulo :


CINEMATECA BRASILEIRA - FOLHETOS DE SALAS

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BIBLIOGRAFIA DO SITE

PRINCIPAIS FONTES DE PESQUISA

1. Arquivos institucionais e privados

Bibliotecas da Cinemateca Brasileira, FAAP - Fundação Armando Alvares Penteado e Faculdade de Arquitetura e Urbanismo - Mackenzie.

2. Principais publicações

Acervo digital dos jornais Correio de São Paulo, Correio Paulistano, O Estado de S.Paulo e Folha de S.Paulo.

Acervo digital dos periódicos A Cigarra, Cine-Reporter e Cinearte.

Site Arquivo Histórico de São Paulo - Inventário dos Espaços de Sociabilidade Cinematográfica na Cidade de São Paulo: 1895-1929, de José Inácio de Melo Souza.

Periódico Acrópole (1938 a 1971)

Livro Salões, Circos e Cinemas de São Paulo, de Vicente de Paula Araújo - Ed. Perspectiva - 1981

Livro Salas de Cinema em São Paulo, de Inimá Simões - PW/Secretaria Municipal de Cultura/Secretaria de Estado da Cultura - 1990

Site Novo Milênio, de Santos - SP
www.novomilenio.inf.br/santos

FONTES DE IMAGEM

Periódico Acrópole - Fotógrafos: José Moscardi, Leon Liberman, P. C. Scheier e Zanella.

Fotos exclusivas com publicação autorizada no site dos acervos particulares de Joel La Laina Sene, Caio Quintino,
Luiz Carlos Pereira da Silva e Ivany Cury.

PRINCIPAIS COLABORADORES

Luiz Carlos Pereira da Silva e João Luiz Vieira.

OUTRAS FONTES: INDICADAS NAS POSTAGENS.