Cine Independência - Santa Maria (RS)

Crônica de Marcelo Canellas

Ilustre participação do premiado repórter especial da Rede Globo, o gaúcho Marcelo Canellas. Texto do livro "Províncias - Crônicas da alma interiorana", lançado recentemente pela Editora Globo.



Cine Independência, com publicação autorizada pelo autor, reflete sobre a importância da preservação de antigos cinemas, não apenas pelo valor histórico e arquitetônico, mas pela permanência de um símbolo da memória cultural e afetiva de um povo. Locais que trazem lembranças de emoções e fantasias vividas por antigas e novas gerações. Como já dizia Kleber Mendonça Filho (diretor do premiado filme "O Som ao Redor"): "Vejo as salas de cinema (especialmente as antigas) como monumentos à passagem do tempo, lugares impregnados de gente e suas histórias". - Antonio Ricardo Soriano

Cine Independência

O VENDE-SE em letras enormes na fachada do Cine Independência me fustigou por dias a fio. Até que me ocorreu: será que o proprietário não aceitaria um escambo? Como não tenho dinheiro no banco, eu poderia dar em troca o sítio onde moro. Não, quatro hectares de cascalho e mato não seduziriam um negociante de imóveis. Minhas jabuticabeiras cravejadas com as pérolas negras do meu pomar são tesouro escasso para quem quer ganhar dinheiro com um velho cinema.

Penso, então, em oferecer toda a fortuna que o próprio
Independência me legou ao longo dos anos. Posso abrir a arca que guarda o tropel dos peles-vermelhas perseguindo John Wayne ou James Stewart. Logo atrás, viriam Tarzan e Fantasma, guardiões da mãe África. E todos aqueles personagens que pularam das telas para nos fazer companhia nos circos, nas selvas e nos sete mares das nossas casas e quintais: Dumbo, Mogli, Barba Ruiva.

Posso regatear com todas as guerras estelares; posso clamar por todas as súplicas, traições, incestos, perdões e rupturas irreconciliáveis que testemunhei; posso argumentar com todos os sustos, todas as lágrimas, toda a irritação por finais previsíveis.


Certamente vale muito o hábito das senhoras aposentadas, que usavam suas tardes livres para ir à matinê sem nem sequer se preocupar em checar a programação. O que também gerava enganos terríveis, como o da minha velha tia-avó que, ao ler o título Ganganta Profunda, achou tratar-se de uma love story. Até sair porta afora depois de, logo nas primeiras cenas, descobrir que tinha love de mais e story de menos.

Posso oferecer de lambuja os festivais de música regionalista a que assisti. E - joia rara do meu baú - o beijo que roubei da minha primeira namorada num show do jovem Alceu Valença.


Vou pedir um bom desconto pelos anos em que o
Independência virou igreja evangélica. Mas nem por isso vou deixar de orar para que, em caso de recusar minha proposta, o proprietário só venda o cinema a quem veja naquele espaço algo mais do que um prédio velho. Que conveniência financeira vale a cicatriz de uma cidade sem rosto?

Cine Independência nos anos de 1960 - Santa Maria (RS)
Foto : Blog "
Santa Maria em Fotos", de Valeska Huffel

Filmes em cartazes

Produção de placas e fachadas promocionais dos cinemas quando não havia tecnologia de impressão de grandes formatos.
Por Sylvio Luiz Panza (Escritor)
Nos meados da década de oitenta eu trabalhava próximo da Avenida São João e sempre passava em frente aos tradicionais cinemas, que começavam a perder espaço para as novas salas instaladas nos shopping centers que surgiam aqui e ali pela cidade de São Paulo.
Certa vez percebi, naquela mesma avenida, uma pequena porta entreaberta que parecia ser uma marcenaria muito simples, mas que me chamou a atenção, pois havia um artista pintando, à meia luz, uma grande tela.

Muitos cartazes no cine Belas Artes
Ao entrar para conversar com aquele pintor me deparei com vários painéis de filmes de cinema que entrariam em cartaz nos cinemas da cidade.
Nunca havia parado para reparar que, pelo alto custo das tecnologias de grandes impressões, que ainda engatinhavam naquela época, os cinemas utilizavam o trabalho de artistas que pintavam manualmente suas fachadas e cartazes promocionais dos filmes.

Grande cartaz no cine Ipiranga
Cada sala era responsável pelas placas de divulgação interna e externa dos filmes, dependendo da habilidade de marceneiros e pintores para chamar a atenção do público, incluindo em alguns casos simples efeitos de iluminação e de maquetes, muito diferentes do que vemos hoje nas literalmente cinematográficas produções publicitárias de cada estreia.
Em uma longa conversa com o desenhista fiquei sabendo que aquele tipo de arte já estava deixando de existir, por conta das novas tecnologias que substituíam este trabalho de forma mais prática, padronizada e com alta qualidade.
A necessidade de concluir a pintura de enormes painéis com grande rapidez muitas vezes resultava em ilustrações que apenas lembravam os rostos de atores e atrizes do filme.
Acredito que eu tenha, naquela ocasião, visitado um dos últimos estúdios de produção manual de cartazes promocionais para filmes de cinemas, que davam um maravilhoso ar artesanal às salas de projeção de antigamente.
Hoje a publicidade dos filmes já é um espetáculo à parte, que também trará boas lembranças no futuro, quando novas tecnologias surgirão.
Mais textos sobre cartazes de cinema:
O último pintor de cinema
Os cartazes dos cinemas
Tempos de censura

Os lanterninhas de cinema

Por Sylvio Luiz Panza (Escritor)

Hoje em dia é natural que poucos saibam o que eram os chamados lanterninhas ou vaga-lumes, que trabalhavam nos cinemas há algumas déc

adas atrás. Porém, é possível afirmar que todo mundo conhece pelo menos uma pessoa que trabalhou nesta atividade. Esta pode parecer uma afirmação meio estranha, mas ao longo deste texto veremos que ela faz sentido.
O lanterninha de cinema era um profissional que, munido de uma lanterna, tinha a função de acompanhar as pessoas que chegavam atrasadas na sessão de cinema quando as luzes já estavam apagadas. Por saber onde havia um lugar
vago auxiliavam a se direcionarem com

segurança e rapidez ao melhor lugar disponível. Quando a cadeira era numerada a coluna e a fileira era prontamente indicada. O mesmo aconte
cia se alguém desejava ir ao banheiro ou à lanchonete durante o filme.
Também eram muito úteis ao administrar questões como barulhos e conversas que estivessem atrapalhando a plateia. Contudo, eram
criticados ou não muito bem vistos por casais de namorados mais animados ou por aqueles que queriam colocar os pés apoiados na poltrona da frente, por exemplo. Muitos eram alvos de xingamentos e até levavam umas pipocadas, uma injustiça com quem estava ali para ajudar a plateia.
Na verdade o desempenho do lanterninha tanto podia ser o de auxílio, como um transtorno, dependendo do seu estilo de atuação. Podemos comparar com um arbitro de futebol: os melhores eram aqueles que menos apareciam.
Era comum alguns destes profissionais tomarem uma postura mais policial do que de auxiliador e, no meio do filme, o seu facho de luz
percorria as fileiras para que ele pudesse averiguar se estava correndo tudo bem.
Durante um bom tempo os lanterninhas tinham um estiloso e característico uniforme que dava certo glamour às chamadas salas de espetáculos. Hoje eles foram substituídos pela iluminação nos degraus que levam às poltronas dos cinemas e a "disciplina", bem, esta ficou por conta do bom senso da própria plateia.
Ah, sim! Quanto à afirmação de que todos nós já conhecemos pelo menos um lanterninha é porque há um ilustre personagem que trabalhou nesta profissão no início da sua carreira e, como o mundo dá voltas, acabou saindo dos corredores e fileiras dos cinemas para fazer sucesso inclusive dentro das telas. Seu nome é Elvis Presley!
Elvis lanterninha?
Por Antonio Ricardo Soriano
Elvis Presley trabalhou como porteiro no Loew’s State Theatre (152 S. Main Street, Memphis), em 1950, logo quando recebeu sua carteira de trabalho (Social Security card # 409-52-2202). Depois, em 1952, voltou a trabalhar no mesmo local, mas por pouco tempo.
O porteiro de cinema nos EUA têm as mesmas funções dos nossos antigos lanterninhas. Veja a descrição completa das funções de um porteiro de cinema nos EUA.

Na foto, Elvis Presley segura um quepe de porteiro com seu antigo patrão, Mr. Groom, proprietário do Loew’s State Theatre. Foi um momento divertido e talvez a última vez que Elvis participou de um evento promocional para um de seus filmes (Jailhouse Rock, 1957).

Loew's State Theatre. Nesta foto, podemos observar a divulgação da pré-estreia de "Love Me Tender", primeiro filme de Elvis Presley.

Minhas matinês

Por Pedro Bandeira*
Nasci já sem pai, que morreu aos trinta e cinco anos, deixando dois filhos e eu, uma lembrança na barriga da minha mãe. Meus irmãos eram bem mais velhos, de modo que fui uma criança mais ou menos sozinha, com meus sonhos, minhas leituras e a imensa praia de Santos para ver o pôr-do-sol.
Não, ainda não havia televisão nem videogame para fazer companhia aos meninos solitários. Só pouco depois viria a TV Tupi, trazendo os maravilhosos Júlio Gouveia e Tatiana Belinky e suas fabulosas criações, como “O Teatro da Juventude”, “Polliana”, “Angélica”, “O Pequeno Lorde” e as adaptações inigualáveis do “Sítio do Pica-pau Amarelo”, fazendo-me sonhar com a distante possibilidade de representar o Pedrinho e com a beleza de Edi Cerri, a linda Narizinho... Ah, as covinhas da Edi Cerri, minha grande paixão, ao lado da Elizabeth Taylor, companheira do menino Roddy McDowall em “Lassie Volta para Casa”.
A grande diversão daquele tempo era o cinema. Eu aguardava ansioso o domingo, quando havia a “Matinê Baby”, no Cine Atlântico, que já não existe mais. Eram sessões com curtas-metragens do Gordo e o Magro, do Carlitos, com desenhos da Disney e mais um monte de pequenos filmes. Ah, o cinema! Que delícia quando alguém me levava às sessões das duas e meia, para assistir aos longas-metragens... Lembro-me de ter saído chorando, em desespero, de dois filmes: “Coração Materno”, com o Vicente Celestino, e “Branca de Neve e os Sete Anões”, a obra-prima da Disney (só adultos calejados conseguem ficar firmes vendo aquela bruxa horrorosa!).
Mas o Cine Miramar, que anteriormente havia sido um cassino, desativado pelo Marechal Dutra, o presidente que proibiu os jogos de azar, acabou sendo demolido. No lugar dele, começou a ser erguido um imenso prédio que teria um novo cinema. E a inauguração desse cinema, o Caiçara, acabou coincidindo com meu décimo aniversário. E eu ganhei o melhor dos presentes: como o novo cinema ficava a poucos quarteirões de minha casa, obtive o alvará de ir sozinho à matinê de domingo!
Que alegria! Informaram-me que, rompendo a tradição, a sessão da tarde começaria às duas horas. Recebi o dinheirinho para a entrada e lá fui eu, saltitante de alegria. Lá chegando, informaram-me que a novidade era ainda maior: terminada aquela sessão, imediatamente começaria outra, e outra, e outra... E o melhor é que ninguém era posto para fora no fim de cada sessão! Ah, estava pra mim! Imaginem: assistir a várias sessões pelo preço de uma!
E foi assim que eu vi, uma atrás da outra, cinco sessões corridas de “Sinfonia de Paris”, com o Gene Kelly e a Leslie Caron, até a meia-noite! Maravilha das maravilhas! Nem senti fome, embasbacando-me com aqueles bailados à beira do rio Sena, ao som de George Gershwin...
Bom, é verdade que, ao sair do cinema, toda a polícia de Santos estava à procura de um menininho de dez anos desaparecido – na certa raptado, ou afogado no canal! – e minha mãe estava em puro desespero...
Pena... O Cine Caiçara também não existe mais, assim como o Ipiranga e tantos outros, vitimados pelo videotape e pela televisão... E talvez eu não tenha assistido às cinco sessões inteirinhas. Talvez tenham sido só umas três. Só sei que foi o suficiente para deixar meu bumbum ardendo por um bom tempo...

Texto do livro “Meu Tempo e o Seu”, dos organizadores João Basílio e Maria Teresa Leal - Editora Lê - Belo Horizonte - MG - 2005
Este livro pode ser comprado no site Livraria Cultura.com

* Pedro Bandeira nasceu em Santos (SP), em 1942. Mudou-se para São Paulo em 1961 para estudar Ciências Sociais na USP. Além de professor, trabalhou em teatro profissional até 1967, como ator, diretor, cenógrafo e com teatro de bonecos. Trabalhou também como jornalista e publicitário até tornar-se somente escritor, a partir de 1983. É o autor de literatura juvenil mais vendido no Brasil. Algumas das suas principais obras: A Onça e o Saci; O Guizo do Gato; O Fantástico Mistério de Feiurinha; A Roupa Nova do Rei (Prêmio Jabuti); A Formiga e a Pomba; Laurinha; O Mistério da Fábrica de Livros; O Pequeno Dragão; As Cores de Laurinha; O Pequeno Fantasma; O Pequeno Bicho-Papão; Minha Primeira Paixão; O Pequeno Lobisomem; A Pequena Bruxa; e Brincadeira Mortal, entre outros.

O cine Republica e a maior tela do mundo

Por Antonio Ricardo Soriano

Paulo Sá Pinto, um dos maiores empresários da exibição que tivemos no país, que trouxe para São Paulo inovações como o "3D" (1953), o "CinemaScope" (1954) e o "Cinerama" (1959), inaugura em 07/07/1955, às 21 h., a maior tela do mundo no cine República, com cerca de 250 m2. Foi uma sessão especial do filme "O Mundo é da Mulher" (1954), de Jean Negulesco, para a imprensa, autoridades e convidados. Na foto abaixo, dá para ter uma ideia do tamanho da tela comparada a quantidade de poltronas distribuídas por toda a sua extensão.

No dia seguinte, a grande novidade foi mostrada ao público com a exibição do filme "Átila, o Rei dos Hunos" (1954), de Douglas Sirk. "O Mundo é da Mulher" teve exibição pública somente em 05/08/1955.

Mais informações sobre a grande tela no Banco de Dados do blog.

Quando o Brasil vinha a São Paulo ver cinema

Por Ignácio de Loyola Brandão (Romancista, contista, cronista e jornalista)
Artigo do jornal Folha da Tarde de 17/04/1986. Crônica escrita no período mais decadente das salas de cinema do centro de São Paulo.
Tire uma foto da platéia do Art-Palácio numa segunda-feira, em qualquer sessão. Repita a foto na próxima segunda e vai constatar que os rostos na platéia são absolutamente os mesmos. Talvez com lugares trocados. Esta era uma anedota, que se ouvia no meio cinematográfico paulistano, em relação ao velho cinema do largo Paissandu, que conheceu dias de glória. Naquela época, os produtores disputavam o Art-Palácio aos socos, igual batalhamos hoje por um táxi, na hora do rush. Os filmes do Mazzaroppi tinham sua estréia naquela sala, com direito a refletores na rua e tudo mais. David Cardoso, então pouco mais que figurante, surgia na porta do Art-Palácio, igual o Alain Delon, trinta anos atrás, que ficava nas portas dos cinemas de Cannes, fazendo pose de James Dean. Os dois deram certo, cada um a sua maneira. Hoje, o Art-Palácio, dividido em duas salas paupérrimas, com uma projeção alimentada a velas, porque mal se enxergavam as imagens, foi fechado. E o fechamento nem foi por desejos de se melhorar, mas porque os fiscais do prefeito Jânio Quadros deram em cima e lacraram os cinemas, cheios de irregularidades.
Não é crônica nostálgica, é constatação. O que era o centro de São Paulo em matéria de cinemas, pouco mais de 25 anos atrás e o que é hoje? Nada melhor que documentar o que anda acontecendo com o cinema em geral.
São Paulo era o El Dorado, a Meca. As salas que se abriam eram comentadas, objetos de reportagens pelo país afora. Arquitetos especializados vinham ver o que se fazia por aqui. O República não tinha a maior tela do mundo (sem exageros mineiros)? E o Comodoro, não foi o único do país a projetar Cinerama e terceira-dimensão? Vinham ônibus e caravanas do Interior, e os ingressos eram para lugares numerados, comprados com antecedência. O Olido tinha uma orquestra com o maestro Rafael Pugliesi, elegante em seu fraque, a comandar os músicos. Agora, o Olido foi “salvo”, passou por uma boa reestruturação. O Ipiranga era tão sofisticado que, ainda no início dos anos 60, ali não se entrava sem gravata. Hoje tem gente de cuecas. E quem vai ver o filme no Ipiranga 2 tem de subir uma escadaria danada e enfrenta uma platéia em declive que nos obriga a descer amparados nas poltronas, senão caímos lá embaixo. Além do fato de ouvirmos o tempo inteiro o som que vem do Ipiranga 1, porque não há nenhuma vedação acústica.
______________ Cine Bandeirantes no dia de sua inauguração
O Ouro é o antigo Bandeirantes, que tinha o estilo barroco hollywoodiano, decorado com motivos indígenas e estatuetas de gente que podia ser Fernão Dias ou Paes Leme. Modificado, o Ouro se apresentou como uma rua de Vila Rica. Mas a reforma foi feita no início da decadência geral e o cinema não se sustentou muito. Agora se dedica aos pornôs, mas tem recaídas súbitas, relançando filmes como “Os 10 Mandamentos”. O sistema de som deve se espantar. Dos gemidos eróticos à voz de Deus é um salto grande, convenhamos.
O Ritz São João desapareceu, dando lugar ao Rívoli, que foi inaugurado com “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias”. Ficou um ano em cartaz. Era super luxo. Fechado, retornou outra vez como Ritz, mas no subsolo de um prédio. O Rio Branco também era sala enorme, destinada aos road-shows (filmes de longa duração em cartaz). Foi acabando, acabando, e agora no local funciona uma concessionária de automóveis. Na mesma rua, o Normandie, intelectualmente sofisticado, exibia filmes franceses de categoria. Foi ali que vi “Moderato Cantabile”, de Peter Brooks, baseado em Marguerite Duras. Acabou dividido em dois, Normandie e Bretagne, antecedidos dos pomposos títulos de Palácio do Cinema. Pornôs e kung-fus (ainda existem, imaginam?) são as especialidades.
O Marrocos surgiu para o Festival de Cinema de 1954 e foi construído no melhor estilo de apoteose mental. Como não dava para fazer uma daquelas salas maluquíssimas americanas, contentaram-se em reproduzir o clima marroquino, com fontes, estrelas e meias-luas ou luas crescentes. Estrelas hollywoodianas pisaram aqueles tapetes (Von Stroheim, por exemplo), hoje gastos, manchados. Estrelissímas brasileiras subiam as escadarias para o Oscar brasileiro que era a cerimônia do Sacy. Podem dizer o que quiserem, mas nunca mais se fez uma festa igual em cinema nacional, semelhante ao Sacy. Podem criticar os métodos de escolha (mas qual método é justo, tratando-se de competição cinematográfica, onde egos são exaltadíssimos?), mas era uma festa irrepreensível, divertida, com o melhor do cinema brasileiro. Os convites eram disputadíssimos e aparecer no Sacy era sinônimo de status. De uma forma ou outra, as coisas empobreceram um pouco, quando o jornal “O Estado de S. Paulo” decidiu acabar com o prêmio. Ou talvez, o fim dele coincidisse com o momento geral de deterioração nas artes do país, ocasionada, entre outros, pelo fator político, opressão e censura.
O Coral era sala simples, sem ostentação. No entanto, tinha um charme especial, pois ali eram feitas as projeções da Cinemateca Brasileira. E como havia sessão, uma atrás da outra, a gente se alimentava de cinema, o tempo inteiro. Ali ocorreu a espantosa pré-estréia de “A Doce Vida”, do Fellini, filme chocante na época, quase um catecismo hoje. Ali, quase toquei Catherine Deneuve, diáfana, passando à minha frente, perfumadinha, com a alça do sutiã à mostra. Ali foi a estréia do “O Eclipse”, de Antonioni. O que é o Coral atualmente? Uma sala dupla, com sons vazando de todos os lados. E tome pornôs! Dante Ancona Lopes foi o idealista que “inventou” o Coral. Felizmente o Dante voltou aos tempos antigos, com aquela carga de quem ama cinema. Aí está a recuperação do antigo cine Rio, agora Cinearte 1, no Conjunto Nacional, avenida Paulista. Quem gosta de cinema já sabe: foi justíssimo o prêmio recente dado ao Dante. E foi pouco, muito pouco, pelo que ele tem feito, batalhado. Merece estátua nos cinemas paulistas.
Eu morava no interior quando o Jussara foi aberto, para exibir só filmes franceses. Famosíssimo. Também, os filmes franceses eram os únicos que mostravam os peitos das estrelas. Martine Carol, Françoise Arnoul, a própria Edwige Feuillère, tão “digna”, não mostrou os seus em “Lucrecia Bórgia”? Neste particular, o Jussara, transformado em São José, não mudou muito. Só dá pornô.
______________ Cine Metro no dia de sua inauguração
O Metro era um cinema amado, porque nos envolvia com a decoração rococó que – afirmavam – era igual no mundo inteiro. O mesmo projeto para todas as salas. Para mim, o Metro tinha outra vantagem: era dos pouquíssimos cinemas em que o banheiro era limpo. Quando me apertava no centro, entrava ali, tranqüilo. Reformado, adquiriu aquela decoração asséptica, sem graça. Dividido em duas salas, vai se mantendo.
E o Windsor? Luxo só, coube a ele a glória de exibir ao paulistano, em avant-première, o filme de um jovem baiano que assombrou o mundo: “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, do Glauber Rocha.
Marabá, o Paissandu, o Regina. Todos se esvaiando lentamente, se suportando com sexo explícito ou tentativas de bilheterias, tipo “Goonies” ou “Rambo”. Cada vez mais vazios, são a mostra de que algo se passou e as pessoas ainda não entenderam. O mundo mudou. A violência nas ruas, o preço dos ingressos, as dificuldades de trânsito, estacionamento, o surgimento da televisão, do videocassete, a mudança de costumes. Transição? O cinema tem passado por crises e tem suportado. Começo dos anos 50. O desespero bateu. Inventaram Cinemascope, terceira-dimensão, VistaVision, e não sei o que mais. O cinema sobreviveu, assimilou a televisão e serviu-se dela. E agora? Para onde vamos? Qual o caminho? Salas pequenas, público restrito, selecionado? Ou seria apenas um problema de qualidade geral?
Fotos do livro "Salas de cinema em São Paulo", de Inimá Simões.

Rino Levi: o arquiteto dos cinemas gigantes

Por Antonio Ricardo Soriano.

Rino Levi nasceu em 1901, em São Paulo. Faleceu em 1965. Estudou em Milão e roma, onde se formou em 1926 na Real Escola Superior de Arquitetura de Roma.












Rino Levi teve uma destacada importância na implantação do movimento moderno no Brasil, seja pela repercussão de seus projetos, seja pela sua ativa participação no ensino e na valorização do trabalho profissional.

Ao iniciar sua carreira, Rino Levi chega a uma São Paulo ainda provinciana, com pouco mais de um milhão de habitantes. Nessa época, apenas se iniciava o processo de industrialização que a transformaria na capital econômica do país. Seus primeiros projetos revelam influências diversas como o racionalismo italiano, o art deco e a obra de Erich Mendelsohn.

Na década de 30, Rino Levi recebe uma complexa incumbência: projetar um novo e grande cinema para São Paulo. Inaugurado em 1936, o UFA Palacio, com mais de 3000 lugares, foi profundamente inovador: sem frisas e camarotes, todos os espectadores são igualados numa grande plateia e balcão com perfeitas condições de visibilidade e acústica.




A obra obtém um enorme sucesso de crítica e público, que garante ao arquiteto a encomenda sucessiva de novos cinemas: o cine Universo (4324 lugares), o Piratininga (4313 lugares) e finalmente, o cine Ipiranga com 1936 lugares. Infelizmente, a capacidade de lugares dos cinemas citados variam um pouco nas pesquisas que fiz.

Fachada do cine Ipiranga., ainda com placa de Rino Levi.





















O arquiteto ocupou-se pessoalmente da acústica da grande sala de projeção do cine Ipiranga, que resultou perfeita, com seus dois balcões de formas curvas, puros, austeros e elegantes.

Balcões (plateias superiores) do cine Ipiranga













Terminada a Segunda Guerra, o país entra numa fase de intensa industrialização e rápida urbanização. Para o arquiteto, são anos de grande produção. A partir de 1945, realiza vários projetos para a construção de grandes hospitais, como Hospital Maternidade da Universidade de São Paulo, Hospital Central do Câncer e Hospital Geral Albert Einstein.


Planta do cine Universo




































Em 1965, a equipe Rino Levi vence o concurso para o Centro Cívico de Santo André, uma obra complexa, organizada por meio de uma esplanada para pedestres. Os jardins e as obras de arte que completam esse conjunto são de Roberto Burle Marx.



Após a morte de seu fundador, o escritório assume a denominação de Rino Levi Arquitetos Associados e decide prosseguir o trabalho dentro das diretrizes estabelecidas.

Fontes de pesquisa:
Livro "Arquitetura Italiana em São Paulo", de Bruno Giovannetti - Consulado Geral da Itália - São Paulo - 1994.

Lembranças da Santos de minha época

Por Rubens Ewald Filho (Publicação autorizada pelo próprio autor)
Quando a gente fala em programa duplo hoje em dia, as pessoas não entendem nada. O que era isso?
Pois é, houve um tempo em que as famílias iam juntas ao cinema, em geral, no fim de semana. Havia os cinemas lançadores e os de bairro, que adotavam a tradição mundial do “double feature”. Primeiro, passavam um filme B, de menor duração, junto de complementos, como documentários, trailers, desenhos animados ou comédias curtas. Depois, após um intervalo, ai sim, vinha o filme principal.
Na cidade de Santos, nos anos 50, não era diferente. Havia cinemas lançadores, como o Roxy (o único que, de uma maneira ou outra, sobreviveu), o Iporanga (surgido nos anos 50, estreando com “O Retrato de Jennie”), o Caiçara (no Boqueirão, começando com “O Manto Sagrado”), o Atlântico (na Praça Independência, demolido) e o Gonzaga (onde hoje há McDonalds). Mais tarde, viria se juntar a nossa Cinelândia, o Praia Palace (inaugurado com “A Ponte do Rio Kwai”) e o Teatro Independência (que também virou cinema com “Adeus as Armas”). Já nos bairros da cidade, havia um ou até mais cinemas, muitas vezes próximos um do outro. E todos eles lotavam. E os filmes iam seguindo determinada ordem, até percorrer a cidade inteira (a preços mais acessíveis). E, também, com mudanças na programação durante a semana. Ou seja, a população ia ao cinema e Santos era um ótimo lugar para ver filmes. Até porque tinha as vantagens de um cinema de interior.
O grande terror eram os filmes proibidos para menores de 18 anos, que eram determinados pela censura por critérios misteriosos, e hoje em dia, meio ridículos. Mas, enfim, já se sabia que os filmes europeus em geral (principalmente os franceses) tinham fama de mais fortes, portanto eram proibidos (essa era uma época em que até mesmo os filmes de Bergman eram taxados como eróticos, pela naturalidade das cenas de nudez, por exemplo, em “Mônica e o Verão”). Para um garoto, o grande desafio era enganar o porteiro, seja com carteira de escola falsificada, seja pagando inteira. É claro que eles não acreditavam, mas tudo fazia parte de uma hipocrisia que perdura até hoje. De qualquer forma, o terror era um porteiro baixinho, que ficava no cine Atlântico, que não caia na conversa e você tinha que devolver o ingresso (até hoje tenho pesadelos com isso e corro atrás de filmes que não consegui assistir porque fui barrado). Felizmente, eu era alto para a minha idade e desde “Bom Dia Tristeza”, baseado no escandaloso livro de Françoise Sagan, consegui ver praticamente todos os filmes proibidos até os 18 anos (dois momentos que não esqueço, foi a estréia de “La Dolce Vita” no mais novo cinema da nossa Cinelândia, o Indaiá, e um filme europeu chamado “O Terceiro Sexo”, sobre homossexualismo, em que até o jovem Pelé estava presente).
O que no fundo estou querendo dizer é que, se você gostava de cinema, Santos era uma boa cidade para se crescer. Ainda hoje com tantas perdas de salas, apesar de tudo, somos privilegiados, já que nenhuma cidade do tamanho de Santos tem número igual de alternativas. Isso sem falar no Clube de Cinema de Santos (fundado em 16 de outubro de 1948), que foi um dos primeiros cineclubes do país e que fez um belo trabalho durante muitas décadas. Foi uma sorte existir o Maurice Legeard e o seu Clube de Cinema que, durante os anos 60, cobria as falhas dos lançamentos na cidade. Acontecia, também, em Santos, a famosa “sessão da meia-noite” do Roxy, onde assistíamos de tudo, de Fellini a Bergman, do cinema tcheco ao russo. Era um momento maior da criatividade do cinema e, felizmente, não ficamos de fora.
Rubens Ewald Filho
Santista de nascimento e de coração, Rubens Ewald Filho recebeu o título de “Cidadão Emérito” da cidade e se orgulha de nela haver uma sala de arte com seu nome. Aliás, foi no jornal “Tribuna de Santos” que começou a escrever e onde ainda hoje mantém uma coluna. Tempos depois, em São Paulo, passou a escrever também para o “Jornal da Tarde” e o jornal “O Estado de S.Paulo”. Em sua longa e vitoriosa carreira como jornalista colaborou com os principais órgãos de imprensa do Brasil, incluindo a revista “Veja”.
Foi para a televisão no começo dos anos 1970, passando por várias emissoras como autor de novelas (entre elas a adaptação do texto de Sra. Leandro de Drupré, “Éramos Seis”, que recebeu o “Troféu Imprensa” e o “Prêmio APCA”). Trabalhou, também, como apresentador, programador, diretor de produção e programação na HBO Brasil. Além disso, foi diretor de curtas-metragens e atuou como assistente de direção, roteirista e ator em vários filmes. Em seus mais de trinta anos de carreira, Rubens Ewald Filho ostenta o título invejável de ser o mais conhecido e popular crítico de cinema do Brasil, graças principalmente às suas aparições na televisão, quando apresentou o “TV Escolha”, na Rede TV, o “Cine Brasil”, na Rede Cultura, a festa do “Oscar” pelo SBT e Rede Globo e seu próprio programa “Cinema com Rubens Ewald Filho”, pela Rede Telecine, mas também pela significativa marca de mais de vinte mil filmes vistos e registrados.
Em 1978, Rubens iniciou a sua carreira de autor de livros lançando a primeira edição do “Dicionário de Cineastas”, uma obra inédita e sem similar no Brasil. Em 1985, publicou uma nova edição revista do dicionário. Nos anos 1980, os seus “Guias de Vídeo - Vídeo News” tiveram treze edições. Publicou também os pioneiros “Os Filmes de Hoje na TV” e “Guia do DVD”. Em 2001, lançou “Os Cem Melhores Filmes do Século 20” e “Cult Movies do Século 20”, e uma nova edição revista e ampliada do “Dicionário de Cineastas”. Em 2002 editou o “Guia de Filmes em DVD - DVD News”. Em 2003 lança “O Oscar e Eu”. Em 2007, o “Guia de DVD 2007 - Cinema com Rubens Ewald Filho” e, com Nilu Lebert, “O Cinema Vai à Mesa”. Em 2008, um novo “Guia de DVD” (atualizado) e mais um livro com Nilu Lebert, “Bebendo Estrelas”.
Biografia extraída do livro “Dicionário de Cineastas”, de Rubens Ewald Filho, com atualizações de Antonio Ricardo Soriano.

Quem matou o cinema de rua?

Por Maurício Kus - mkus@uol.com.br

Esta é uma charada que nem Sherlock Holmes conseguiria decifrar. São tantas as causas que acabaram com o cinema de rua, que um cirurgião diria que o paciente morreu de infecção generalizada.

Há os que pregam que o carro acabou com o habito de ir ao cinema com mais frequência.  Quando Juscelino Kubistchek instalou a indústria automobilística e os primeiros Volkswagen e DKW começaram a aparecer nas garagens da classe média, as pessoas descobriram alternativas para o entretenimento, além do cinema. As famílias passaram a admirar os encantos das cidades da Grande São Paulo, faziam passeios de carro, almoçavam fora, visitavam mais os parentes e amigos (nem que fosse para exibir o carro novo) e as bilheterias foram definhando.

Outros afirmavam que a televisão matou o cinema, principalmente o cinema nacional.  Exibindo filmes dublados, conquistava uma grande maioria de não alfabetizados ou semialfabetizados que tinham dificuldades em acompanhar as legendas, enquanto os diálogos se desenvolviam.  Porém, o maior prejuízo que a televisão trouxe ao cinema, foi justamente para o filme brasileiro. Contratando os grandes astros do cinema e lançando programas de shows e variedades com o mesmo desenvolvimento humorístico das tradicionais chanchadas do cinema nacional da época, a televisão fez os cinemeiros migrarem para a televisão, deixando de ir ao cinema.  A chanchada acabou e a Atlântida, do produtor e exibidor Luiz Severiano Ribeiro, submergiu naquele chafariz que era a sua marca registrada.

Lançamento do filme nacional Angela (1951) no cine Marabá














Mazzaropi resistiu com firmeza ao canto da sereia da televisão e continuou produzindo seus próprios filmes, que eram sucesso de bilheteria.  Todo dia 25 de janeiro lançava o filme do ano e recusava convites para entrevistas de televisão nos talk shows da época. Dizia: “Porque vou dar de graça, o que o público paga para ver nos cinemas?”. Morreu milionário, seus herdeiros delapidaram sua fortuna, seu acervo de filmes sumiu, mas permanece como um ícone do cinema brasileiro.  Se o México tem Cantinflas; a Itália, Totó; a França Jacques Tati; a Inglaterra, Mr. Beans, cultuados pelo público e pela crítica, porque nossos críticos são tão esnobes? Nunca reconheceram e não reconhecem até hoje, o valor de Mazzaropi, negando o destaque merecido no cinema nacional.  Será porque fazia filmes para as classes D e E, as mesmas cobiçadas hoje por dez entre dez proprietários de supermercados?

Luiz Severiano Ribeiro fez uma adaptação do bordão do mercado americano “Cinema é a melhor diversão”, mas não colou, as bilheterias rodavam ladeira abaixo e os cinemas de rua, nos bairros, iam fechando.

Outro argumento poderoso que matou os cinemas de rua foi a segurança.  As pessoas começaram a ficar com medo de sair à rua, à noite.   Mesmo indo de carro, havia o problema de estacionamento, que os shoppings resolveram, abrigando cinema, espectador e carro sob o mesmo teto. Tradução, mais cinemas de rua fechando.

Depois vieram, a especulação imobiliária, a pirataria, as igrejas evangélicas e a fase Cinemark, com cinemas tipo stadium, que devolveram a alegria de ir ao cinema. Introduziu-se a pipoca combo, Coca Cola, lanchonete, poltronas confortáveis, ar condicionado, projeção e som perfeitos e outras benesses que fizeram o cinema voltar a ser programa, inclusive poltronas numeradas e compra de ingressos pela internet, sem fila.

O público encolheu e os preços subiram, mas o cinema nunca vai morrer.  Seus métodos de comercialização, marketing e merchandising evoluem constantemente, seja exibição em TV aberta, TV paga, licenciamento de produtos de consumo, Blu-ray’s, DVD’s ou CD’s.
Porém, para movimentar todo este universo de rentabilidade, tem que haver o filme.  Sem o set de filmagem, sem produzir um filme, nada disto acontece, nem que surjam outras mil formas de exibição e comercialização. Por isso, uma boa história, um roteiro bem feito, um bom diretor e um elenco de talento ainda são a melhor diversão, enfatizando a frase espalhada por Luiz Severiano Ribeiro.

Os cinemas de rua tinham particularidades interessantes.  O Brás, como era um bairro de maior densidade demográfica, tinha maior número de salas. O Universo e o Piratininga tinham acima de 3.000 lugares cada, e como ar condicionado era um luxo, o Universo tinha o teto retrátil que abria nas noites de calor. Além destes dois, o Brás contabilizava o Roxy e o Colombo. Este último terminou de forma trágica. Numa matinê de domingo, durante um combate aéreo na tela, alguém gritou “Fogo!”.  O cinema tinha cerca de 500 pessoas que se levantaram em pânico, houve pisoteamentos, resultando em quase 300 feridos e mais de 100 mortos. Não tinha fogo nenhum, só tristeza, lágrimas e uma cidade traumatizada.

Cine Universo
Claraboia no cine Universo

































No bairro da Liberdade existiam três cinemas, Niterói, da Toei; o Nippon, da Shoshiku e o Nikatsu que exibiam as mais recentes produções japonesas dos estúdios que levavam o nome do cinema.

Cine Nippon

Cine Niterói

































Os “cinemas poeira” ficavam no centro velho de São Paulo.  Eram o Alhambra, Cairo, São Bento, Santa Helena e Pedro II, que exibiam filmes em programa duplo desde as 10 horas da manhã. Contrariamente aos outros cinemas, suas piores bilheterias eram no sábado e domingo, quando os escritórios e o comércio fechavam. Seus frequentadores eram office boys, oficiais de justiça, vendedores, pessoal dos escritórios que davam uma esticadinha no horário do almoço, e colegiais de uniforme e pasta de livros na mão, que cabulavam a aula. Passavam filmes de muita ação, cuja duração não passava de 80 minutos, em sua maioria westerns, estrelados por Tom Mix, Gene Autry, Roy Rogers, Hopalong Cassidy e os grandes astros Joel McCrea e Randolph Scott.  Muitos juravam que os dois machões dos bang bang eram amantes, mas naquele tempo o segredo de ser gay era mais bem guardado que a fórmula da Coca Cola.

Cine Alhambra
Cine São Bento
Alguns cinemas de rua permanecem, mas adotam nomes de empresas patrocinadoras para suportar os elevados custos de aluguéis ou preservar o espaço da cobiça das incorporadoras que adorariam vê-los transformados em espigões. Os principais são: Espaço Itaú de Cinema Augusta (antes, Majestic), o CineSesc (antes, Orly), o Cine Sabesp (antes, Fiammetta) e o futuro Cine CAIXA Belas Artes (antes, Trianon). Outros foram transformados em teatro, como o Gazeta, o Bijou e o Paramount.

O cine Astor (que bom!), no Conjunto Nacional, hoje é a mega Livraria Cultura, que tem até um teatro funcionando regularmente, em meio a milhares de livros.

O tradicional cine Windsor fechou recentemente e virou igreja. O Jussara (depois Dom José) é forçado a adotar uma programação “adulta” para não fechar, mas há comentários no mercado, que o proprietário pretende uma revitalização da sala, voltando à programação normal, como sua contribuição para a reabilitação da velha Cinelândia paulistana.

Cine Dom Jose (2009)

Cine Dom José na Virada Cultural (2010)


































O Cine Metro, o primeiro a ter ar condicionado do Brasil, hoje é a sede de uma igreja evangélica que ocupa o vizinho cine Oásis como estúdio para a elaboração e gravação dos programas.

Em 1942, numa época em que os filmes ficavam entre duas a três semanas em exibição, o cine Trianon (onde hoje é o Belas Artes), exibiu por um ano o filme “Sempre em meu coração”, estrelado por Kay Francis, cantora de muito sucesso nos Estados Unidos, onde brilhava no teatro, rádio e cinema. Fez mais de 50 filmes, mas o sucesso brasileiro foi  um acontecimento inesperado para os estúdios de Hollywood.

O cine Arlequim funcionou como auditório da Rede Bandeirantes, mas hoje é uma igreja evangélica. A maioria dos cinemas de rua foi demolida e hoje não se reconhece sua localização exata, cercados de altos edifícios de escritório ou residenciais. Alguns como o Rio Branco, que tinha exibição em 70 mm e exibia os blockbusters da época,  viraram estacionamento.

O Marrocos, o mais luxuoso cinema de São Paulo, sede do Festival Internacional de Cinema no IV Centenário de São Paulo, exigia uso de gravata de seus espectadores.  Lembro que um dos porteiros “alugava” as gravatas para quem estivesse só de paletó, as mantendo guardadas na chapelaria. Sim, o Marrocos tinha chapelaria. Seu proprietário Lucydio Ceravolo, foi um dos últimos gentlemen de sua época.

Cine Marrocos















Tivemos dois cinemas especiais: o Comodoro Cinerama que exibia filmes através de três projetores que funcionavam simultaneamente, dando uma impressão de terceira dimensão numa tela gigantesca e o Cinespacial, um cinema circular com três telas exibindo o mesmo filme, e com visão boa de qualquer lugar.

 
Vídeo do processo Cinerama de exibição

O Nacional, na Lapa, depois virou casa de shows e mantinha nos andares superiores do prédio os escritórios da Cia. Cinematográfica Serrador.

Como esquecer o meu primeiro cinema?     

Bons tempos aqueles, em que eu, aos doze anos de idade, saía do cine Lux, dez e meia da noite, andava a pé pela Rua José Paulino e atravessava (incólume) o que hoje é a cracolândia e chegava em casa, tratando de dormir logo, pois no dia seguinte tinha aula cedinho da manhã...

Mauricio Kus













Um dos pioneiros na divulgação e publicidade de filmes em São Paulo, iniciou sua carreira em 1949, como crítico da revista “O Reflexo”. 
Foi um dos organizadores da I Exposição Internacional de Historia em Quadrinhos, realizada em São Paulo em 1951. 
Fez a divulgação de centenas de filmes, nacionais e estrangeiros, em 30 anos de atividades cinematográficas, incluindo “O Pagador de Promessas”, único filme brasileiro premiado com a Palma de Ouro em Cannes.
Cobriu, como jornalista, o Festival Internacional de Cinema do IV Centenário em 1954, e o Festival Internacional de Freeport, Bahamas, organizado pela Warner Bros
Frequentou os festivais de Gramado, Teresópolis, Cannes, Veneza e Rio de Janeiro. Assistiu, em Los Angeles, a entrega do Prêmio Oscar em 1976
Foi anfitrião de artistas como Kirk Douglas, William Wyler, Kim Novak, Sylvia Kristel, Maria Schneider, Louis Malle, Topol, as Bond Girls, os irmãos Broccoli (produtores da franquia 007), Debbie Reynolds, Roman Polansky, Cliff Robertson, Sammy Davis Jr., Joan Crawford, Telly Savalas e muitos outros.

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BIBLIOGRAFIA DO SITE

PRINCIPAIS FONTES DE PESQUISA

1. Arquivos institucionais e privados

Bibliotecas da Cinemateca Brasileira, FAAP - Fundação Armando Alvares Penteado e Faculdade de Arquitetura e Urbanismo - Mackenzie.

2. Principais publicações

Acervo digital dos jornais Correio de São Paulo, Correio Paulistano, O Estado de S.Paulo e Folha de S.Paulo.

Acervo digital dos periódicos A Cigarra, Cine-Reporter e Cinearte.

Site Arquivo Histórico de São Paulo - Inventário dos Espaços de Sociabilidade Cinematográfica na Cidade de São Paulo: 1895-1929, de José Inácio de Melo Souza.

Periódico Acrópole (1938 a 1971)

Livro Salões, Circos e Cinemas de São Paulo, de Vicente de Paula Araújo - Ed. Perspectiva - 1981

Livro Salas de Cinema em São Paulo, de Inimá Simões - PW/Secretaria Municipal de Cultura/Secretaria de Estado da Cultura - 1990

Site Novo Milênio, de Santos - SP
www.novomilenio.inf.br/santos

FONTES DE IMAGEM

Periódico Acrópole - Fotógrafos: José Moscardi, Leon Liberman, P. C. Scheier e Zanella.

Fotos exclusivas com publicação autorizada no site dos acervos particulares de Joel La Laina Sene, Caio Quintino,
Luiz Carlos Pereira da Silva e Ivany Cury.

PRINCIPAIS COLABORADORES

Luiz Carlos Pereira da Silva e João Luiz Vieira.

OUTRAS FONTES: INDICADAS NAS POSTAGENS.